MEUS OITENTA ANOS

 

João Bosco Carmurça


Pelo lado histórico de minha vida escapei de morrer afogado por duas vezes: na barragem do Sítio Santos e na praia do Pirambu, no Jacarecanga. Nas duas vezes, salvaram-me o meu irmão Edílio e meu primo Evandro. É muita coincidência, mas foram eles mesmos, os heróis anônimos que eu tive...
Bem, ao longo da vida, tive minha infância passada à Rua Pedro I, 877, no centro de Fortaleza. Andei muito de bonde até 1949, quando o Prefeito Acrísio Moreira da Rocha fez a bondade de retirar os bondes de circulação e só muito tempo depois, os respectivos trilhos. Acho que saía mais barato passar uma mão de asfalto nas ruas com trilhos, do que retirá-los a muque para revender a ferragem no ferro velho.
Bem, eu disse que tinha andado muito de bonde (Jacarecanga, Aldeota, Soares Moreno, São Gerardo e Joaquim Távora). Depois do velho bonde, andei de jumento no Sítio Santos do meu tio Santos e sua mulher, Eugênia irmã de minha mãe. Andei de trem entre Fortaleza e Acarape, Baturité & Adjacências... Anos mais tarde, por volta de 1954, fui para Recife de ônibus noturno interestadual (dois dias de viagem), cortando pela Paraíba até Campina Grande e daí para o Recife. No fim do ano de 1954, voltei para Fortaleza de avião, um C-47 da Panair, onde eu aprendi a comer uma maçã com garfo e faca. Grande experiência. No Rio, em 1959, andei nos bondinhos do Pão de Açúcar.
Aconteceram algumas viagens de trem ao Rio, e a volta para Resende, para o Desfile do Sete de Setembro. No Rio, voltei a andar de bonde. Lá o cobrador nunca me esqueceu, isto é, em tese: em 4 anos que passei pelo Rio, uma única vez fui esquecido...
Já casado, viajei no navio Rosa da Fonseca entre Fortaleza e Belém. Menos de 24 horas, numa viagem sem escalas. O navio só deixou de balançar quando subia o Rio Guamá para atingir o Porto de Belém.
Fiz uma viagem para a Europa pelo navio Ópera: a viagem começou em Salvador, escala no Recife, cruzamos a Linha do Equador, depois Ilha da Madeira (ali eu descobri uma Capela toda ornada em Ouro do Brasil...!), paramos na entrada do Mar Mediterrâneo, descemos para uma excursão de ônibus – terra dos touros Miura – e fomos até uma cidade – almoçamos e voltamos. Desembarcamos em Lisboa. Parecia que eu já conhecia: Torre do Tombo, Monumento aos Navegadores e Descobridores do Caminho das Índias, Mosteiro dos Jerônimos, c casas de Fado.
Banho de mar? Muitos em pontos diferentes do Oceano Atlântico: Fortaleza, Cumbuco, Salvador, Recife (Boa Viagem), Piedade, Jaboatão dos Guararapes, Copacabana, Ilha de Paquetá (com direito a chuva de granizo).  
Onde morei? Fortaleza, Recife (1954, 1972, 1976), Olinda (1974), Manaus (1973 até 1975), Resende.

Não posso comparar a minha vida com os Doze Trabalhos de Hércules. Nem com as vidas de outros heróis. Mas, posso dizer que plantei muitas árvores, escrevi 5 livros e tive dois filhos maravilhosos no primeiro casamento, que me deram um casal de netos (Camila com 15 e Guilherme com 4 anos).

Em 2009 conheci uma senhora, muito inteligente, simpática e alegre, a jornalista Ana Celsa de Magalhães Barroso, que também era viúva (16 anos) que me presenteou com um casal de filhos: Victor, um empresário executivo do ramo óptico e Lize, fisioterapeuta e médica.

Agradeço a Deus e à Virgem Santíssima a vida até esta época, pois ser octogenário neste país sem nunca haver sido assaltado ou tive qualquer interrupção na marcha da vida por doenças físicas ou psicológicas, é difícil encontrar.

Como se diz no bom Latim: Benedicamos Domine! Deo gratias!