..... BIBLIOTECA .....   


 


 

A  ESQUINA 

Olhando de longe parece uma esquina como outra qualquer, com pessoas esperando o sinal abrir para atravessar uma movimentada rua, mas ao se aproximar fica constatado que ali existe um modesto bar com  balcão de forma arredondada, onde é servido um chope bem gelado e bem tirado.

Após um dia de cansativo trabalho é o ponto de encontro de amigos de varias faixas etárias e das mais variadas profissões, esses curtos espaços de tempo, algumas vezes  prolongados em horas são considerados sagrados. é a hora do relax, não  se fala de trabalho, o papo versa sobre assuntos que todos se consideram conhecedores, em condições de dar soluções ou opinar com precisão :  política, futebol, carros, samba e mulher. Todos têm ao menos um caso vivido a contar, quando não lembram ou na verdade não os têm, na mesma hora inventam  para manter a conversa e a discussão por mais tempo e deixar registrada sua historia.

Nessa esquina não existe mentiroso, existem enganadores casuais, que surgem conforme o assunto e sua relevância. A bebida não é um vicio, é um elemento catalisador, entre uma rodada de chope e outra a discussão fica calorosa, veemente, as vezes acerbada, algumas são tão entusiasmadas que  faz-se necessária a intervenção de um mediador. Tudo acertado, gozações e espontâneas gargalhadas são ouvidas por passantes que, por vezes, param para opinar como se suas palavras fossem o juízo final. Quando alguém deixa de aparecer é motivo das mais variadas reflexões e considerações dos presentes, se a ausência é repetida sem explicações, a preocupação é geral, afinal faltar uma aula na esquina deixa o grupo desfalcado de uma  opinião importante .No mês passado fui visitar um velho companheiro possuidor de vários cursos no Brasil e no exterior alem de sua reconhecida cultura geral, fruto de sua avidez pela leitura. Estava bem de saúde e cheio de processos para relatar, mesmo assim fez questão que eu entrasse e falasse da turma, dos assuntos mais em pauta; batemos um bom papo na sala de visitas e quando ia me despedir convidou para acompanha-lo até ao escritório onde guardava com orgulho os diplomas, certificados e condecorações recebidas ao longo de seus mais de oitenta anos. Ao adentrar em seu santuário  não contive minha surpresa  deparando-me com tantos quadros cuidadosamente colocados na parede principal; antes de qualquer formulação minha foi dizendo que me levara ali para mostrar o ultimo diploma recebido, via Sedex, era um singelo quadro  que em letras góticas dizia que era-lhe concedido o titulo de mestre da escola da vida por seus sábios ensinamentos às inumares turmas que freqüentaram  a esquina do relax . Em meus bem vividos sessenta e sete anos participei, desde que cheguei ao bairro, da turma do relax, conheci e fiz amizade com médicos, bancários, advogados, comerciantes, dentistas, frentistas,  despachantes, militares, garçons, juizes, fiscais, policiais, trabalhadores autônomos, vendedores, e outros trabalhadores, responsáveis chefes de família,  estando entre eles o inesquecível mestre. Posso escrever e assinar que todos deveriam receber o mesmo diploma porque na esquina da vida todos estamos repassando ensinamentos que não constam dos compêndios existentes nas livrarias nem nas mais antigas bibliotecas, estão registrados apenas no computador humano de cada um . A esquina, muitas vezes incompreendida ou não aceita por zelosas esposas   é na verdade o lugar em que nos preparamos para entrar em casa deixando os problemas para trás. Sendo este comentário  escrito deixo de citar nomes e fatos concretos que foram objeto de discussões para evitar omissões imperdoáveis tanto no que concerne a nomes quanto a fatos. 

              Rio de Janeiro, 18 de junho de 2006
   Nilo C.Daltro, cronista.


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