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A REDE E EU


João Bosco Camurça
14 de outubro de 2006

Acho que durmo de rede desde que eu me entendo como gente. A rede de algodão é um instrumento de serventia doméstica usado para se dormir, ou apenas repousar, depois do almoço ou nos fins de tarde, para recuperar as energias gastas na faina doméstica.

A rede pode ter tido as suas origens no meio indígena, esta feita de cipós trançados ou mesmo fibras longas similares à corda de sisal. O certo é que os índios usam a rede até nestes tempos mais modernos.

Uma rede tem dois punhos, duas varandas laterais e o tecido propriamente dito. Geralmente uma rede tem três metros de punho a punho. Evidentemente, há maiores e menores. Nesta dimensão, estão as redes para adultos. O punho é colocado em ganchos ou armadores. Por sua vez, os armadores são colocados em paredes de alvenaria ou colunas. Fazendo parte da decoração, podem ser armadas nos quartos de dormir ou em varandas, nunca numa sala. Podem fazer parte da decoração, como disse, em quartos ou varandas.
Nas laterais de uma boa rede, mãos engenhosas que teceram as varandas em crochê ou linha, costuram com fio forte, de modo que a beleza de uma rede seja realçada por este aplique obrigatório.

Seus fios são de algodão grosso, bem urdidos e bem trançados que só uma máquina moderna pode fazê-lo. São resistentes e bonitos. Usualmente, chamamos de “fio de rede”. Há gente que estende estes fios para secar roupa numa varanda em dias de chuva.

O tecido de uma rede é chamado de “pano”. Tais tecidos podem ser tingidos industrial ou artesanalmente, produzindo-se belas cores: amarelo, vermelho, azul, verde em todas as suas tonalidades.

A arte de usar uma rede é muito simples. Não se deita ao comprido, mas em diagonal. Geralmente se usa um pequeno travesseiro ou lençol, este também utilizado, em dia de sol, para vendar os olhos diante de tanta claridade. Depende da pessoa colocar os pés do lado de fora ou ambos do lado de dentro. A acomodação numa rede fica por conta do freguês.

Para se entrar numa rede para repousar, deve-se primeiro testar se os punhos estão bem colocados nos armadores; basta dar um puxavão para constatar. Só depois de confirmar que a rede está segura, com as duas mãos, (vírgula) a pessoa abre as laterais e se senta. No mesmo jogo de “mergulhar” na rede, joga as pernas para dentro. O resto é acomodação.

Quem não sabe abrir uma rede para se deitar, “merece” ir ao chão, (vírgula) provocando enormes problemas e riscos: queda total, machucaduras nos membros, bacia e caixa craniana. É só tomar cuidado.

Casal numa rede? Pode. Faça o teste de carga e aproveite: os dois com as cabeças pro mesmo lado, ou em posições opostas, mas sempre juntos e colados. O resto é imaginação. (com o lembrete de que, talvez como resultado da riqueza de imaginação de seus usuários históricos, a rede foi fundamental, para Câmara Cascudo, no povoamento do litoral do nordeste).

Eu mesmo já imaginei uma rede para casal com um baita feche ecler fechando por dentro. Quem for claustrófobo não experimente: o sujeito endoida e não faz nada que preste. A chance vai pro ralo e seus sonhos viram pesadelos. Na realidade, isto não existe. Mas, deixem o autor divagar...

“Perdoem-me os brasileiros que se julguem de bom gosto e não tenham rede em casa, para seu descanso ou para dormir usualmente, mas das duas uma: ou nunca experimentou, ou não tem bom gosto”.

Para os matemáticos e geômetras, a curva desenvolvida por uma rede se chama catenária. Mas, isto é outra história.

É numa rede balançando feito uma jangada no mar calmo, que eu imagino o que eu escrevo.

Geralmente, é naquele momento da alba matutina ou “início do crepúsculo matutino náutico” que a inspiração surge e amadurece.

Se você tem uma rede em casa, bom proveito.

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